O RESPEITO E A CRISE DE VALORES

 
Respeito, uma palavra tão usada nos últimos tempos, mas tão pouco praticada. Mas, o que o respeito tem a ver com a crise de valores que vemos tão presente no cotidiano do mundo dito moderno?

Ouvimos com bastante frequência as frases, “eu exijo respeito”, “eu mereço respeito”, “eu tenho direito de ter a minha opinião respeitada”, entre tantas outras inúmeras reivindicações. Podemos observar claramente que em todas essas frases, como em todas as outras que são utilizadas com o mesmo objetivo, sempre a palavra “eu” aparece como o legítimo detentor do respeito ao qual tem direito, em detrimento do “outro”, que também como esse “eu”, tem os seus direitos que deveriam ser respeitados e em detrimento do pensamento coletivo, que é a verdadeira expressão da opinião da sociedade.

É essa supervalorização do “eu”, em detrimento do “outro”, que me dá o direito de parar em fila dupla, para pegar o filho no portão do colégio ou para comprar algo rapidamente em uma farmácia ou quiosque, mesmo que se forme uma fila de “outros” que tentam seguir o seu caminho; me dá o direito de taxar o “outro” de ignorante, por não ter as mesmas opiniões políticas, religiosas ou ideológicas que “eu”; me dá o direito de rotular o “outro” de retrógrado, por não ter os mesmos costumes que “eu” ; me dá o direito de chamar o “outro” de alienado, por não ter as mesmas crenças que “eu”.

Criamos tantas Leis, e tantas outras são criadas à cada dia, na tentativa de tornar mais tranquila e saudável a convivência entre as pessoas. Leis que fracassam já na sua criação, por serem a expressão da opinião de alguns “eus”, sem levar em consideração a opinião de tantos “outros”. Quando, e tomara que um dia isso aconteça, percebermos que nos construímos na relação com o “outro”, como já dizia Vigostky, grande pensador russo do início do século passado, iremos perceber também que o “RESPEITO” é a base de qualquer relacionamento saudável.

E é por não termos o “RESPEITO” ao “outro” como o alicerce das nossas ações, que vemos tantas mazelas na sociedade: das brigas de vizinhos, por um incômodo causado por um som alto; uma briga de trânsito, pelo desrespeito ás Leis que tentam levar alguma segurança às ruas e estradas, passando pelas pequenas fraudes que burlam o direito das pessoas até chegar às altas esferas políticas e até ao desrespeito e desvalorização à vida.


Muitas vezes, com o discurso de estarmos exigindo do OUTRO o RESPEITO à nossa opinião, crença ou estilo de vida, somos capazes de atos que agridem a opinião, a crença e o estilo de vida do OUTRO, esquecidos que o RESPEITO não é algo que se impõe e exige, mas que se conquista. Esquecemos também que, talvez, sejamos o mais errado quando queremos impor a nossa verdade ao OUTRO, em detrimento da verdade do OUTRO. Talvez, sejamos mais radicais e intransigentes do que o OUTRO, quando, em nome da nossa verdade, negamos a liberdade do OUTRO de ter a sua verdade.
 
Por não termos o “RESPEITO” ao “outro” presente em nossas ações, também nos tornamos incapazes de praticar outra palavra de igual importância, a GENTILEZA. A falta de RESPEITO ao “outro” e a falta de GENTILEZA na relação com o outro, isso nas mais diversas circunstancias, faz com que seja uma prática normal o motorista que não respeita o pedestre na sua faixa, por sua vez, também o pedestre, que disputa com os veículos, fora da faixa apropriada ou não aguardando o sinal verde para travessia do pedestre; a prática de atitudes que degradam o meio ambiente e os recursos naturais e escassos; o total descaso com o “outro” em filas de atendimentos clínicos e hospitalares, quando as pessoas estão mais fragilizadas e precisando de atenção -  e não estou falando do atendimento apenas no sistema público - nos sistemas privados e atendimentos em planos de saúde também é uma prática comum a falta de RESPEITO e de GENTILEZA para com o “outro” que precisa desses serviços.

E quando alguma coisa pode mudar?

Talvez, um dos caminhos para que isso aconteça, seja quando aprendermos a praticar outra palavra, a EMPATIA. A EMPATIA é a capacidade de se colocar no lugar do “outro”, de perceber a necessidade do “outro”, de perceber a dor do “outro”. Não é necessário sentir a dor do “outro” ou a necessidade do “outro”, basta perceber essa dor ou essa necessidade, e isso só acontece quando buscamos aprender outra palavra chamada COMPREENSÃO. A COMPREENSÃO do “outro”, das necessidades do “outro” e das opiniões e convicções do outro, talvez seja um dos melhores caminhos para a construção de relações mais saudáveis com esse “outro”.

Temos falado tanto na importância do desenvolvimento e prática da Inteligência Emocional / Competência Emocional, traduzidos na busca de atitudes equilibradas e é preciso saber que a essência dessa busca é exatamente a capacidade de compreensão de si mesmo, do “outro” e a construção de relações interpessoais equilibradas.

Você deve ter notado nesse texto que o “outro” foi colocado como o centro da atenção, inclusive sempre escrito entre aspas. Isso para que possamos começar a mudar o nosso olhar, tão acostumado e até incentivado de tantas formas, principalmente pelas mídias que invadem as nossas casas, a olhar apenas para o “MEU”, e possamos aprender a mudar o olhar para enxergar o “EU”, o ”‘OUTRO” e possamos buscar formas de enxergar o “NÓS”. Afinal, ao mesmo tempo que todos que não são “eu” é o meu “outro”, “eu” sou o “outro” do “outro”.
Gilson Tavares
Psicanalista Clínico e Especialista em Gestão de Pessoas
 


Nenhum comentário:

Postar um comentário